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Lower: “Não somos uma banda punk”

Lower: “Não somos uma banda punk”

Hugo Tomé

Os dinamarqueses estreiam-se em Portugal no dia 31 de Outubro no JUR. O vocalista Adrian Toubro fala-nos de punk e do álbum de estreia, “Seek Warmer Climes”.

Por estes dias Copenhaga fervilha de energia. Nascidos na capital dinamarquesa, os Lower gravaram a sua demotape em 2011. Esse primeiro trabalho serviu como base para desenvolver o EP “Walk On Heads”, no ano seguinte. A partir daí, passaram a estar debaixo do radar da crítica e de labels com outro músculo. Este ano, em Junho, estrearam-se na reputadíssima Matador Records com o LP “Seek Warmer Climes”, que irão mostrar em Lisboa, no Musicbox, dentro do evento Jameson Urban Routes.

O frontman Adrian Toubro fala-nos da “cena” de Copenhaga, de punk enquanto um conceito e o quão afastada a banda se sente do mesmo. Fala-nos também dum disco cuja intensidade advém, não de um formulário genérico, mas da busca pessoal por um “lugar ao sol”, como dizia a canção.

Com tantas bandas dinamarquesas a emergir do punk underground, podemos dizer que há aí uma cena? O que se passa por aí afinal?
Há, definitivamente uma cena punk em Copenhaga, algo que já vem desde, mais ou menos, o final dos anos 70 (ainda que com um longo intervalo entre o meio dos anos 80 e final dos anos 90). Mas não creio que nós, ou alguma das bandas no nosso pequeno círculo, sejamos parte disso. As bandas a que me refiro, que tiveram mais atenção internacional e que as pessoas mais conhecem, somos nós, os Iceage, Lust For Youth, Communions e Hand Of Dust. Mas se ouvires, estas bandas são rock, pop rock ou synth pop. Têm existido bandas, com curta duração de vida, cuja música era algo suficientemente selvagem para ser considerado punk, mas estas bandas nunca transcenderam verdadeiramente a cena local.
Não é como se as duas “cenas” estivessem divididas em grupos que se odeiam entre sim ou algo do género. Não há rivalidade, mas raramente vais a um concerto em que uma das bandas da Posh Isolation toca com uma das bandas da cena punk da K-Town. Se querem saber o que se passa com o punk em Copenhaga, sugiro que investiguem editoras como a Adult Crash e a Raw Birth. Há, actualmente, grandes bandas.

Quão punk é comprar vistos de trabalho para tocar nos Estados Unidos, assinar contratos com grandes editoras e distribuidoras?

Então, crês que público e imprensa tendem a um uso excessivo e subsequente vulgarização do punk como um conceito?
Verdade. A imprensa usa o punk como um rótulo para qualquer coisa remotamente vivida. Ultimamente o termo tem vendido de forma louca. Actualmente, qualquer banda é, de alguma forma, uma banda punk. Até vocês nos estão a falar de punk e nós não o somos. Isso é algo que algum jornalista inventou. Se forem aos nossos concertos raramente irão ver punks na audiência e se nos conhecerem, a nós músicos, vão perceber que não somos punk rockers. Nenhum de nós se identifica com algum grupo específico de pessoas, porque não é necessário que “sejamos” algo. Apenas tocamos qualquer que seja a música que se desenvolva na nossa sala de ensaio.
Não quero parecer rude. Eu próprio investi imenso tempo a ouvir música ou a ir a concertos punk desde os meus 13 anos, mas não tenho intenção de ser uma parte de uma comunidade específica. Ainda assim, aprecio as pessoas que o fazem, afinal imensa boa música e arte emergiram através de cenas punk. A maioria das pessoas, fora de Copenhaga, consideram-nos e os Iceage bandas punk, mas quão punk é comprar vistos de trabalho para tocar nos Estados Unidos, assinar contratos com grandes editoras e distribuidoras? Colectivamente, como banda, o punk não nos é nada.

“Seek Warmer Climes”. O que aconteceu com o espírito Viking? Mais a sério, qual o conceito presente no título?
Os vikings navegaram para o sul e atravessaram o Atlântico. Tendo dito isso, eles podem manter as violações e pilhagens para si [risos]. Há um conceito, de facto, envolvido no título. As letras falam, principalmente, sobre encontrar o teu rumo de vida. De lutar para atingires a tua zona de conforto. Se, semanticamente, considerares a palavra “warm” (quente) como algo positivo, em oposição à palavra “cold” (frio) como algo negativo, torna-se fácil perceber.

Apenas tocamos qualquer que seja a música que se desenvolva na nossa sala de ensaio

Ao ouvir o disco há uma sensação imediata de estar-se num ambiente inóspito e intenso. Como tu próprio o descreverias?
É sempre complicado descreveres a tua própria música. Gosto do termo “intenso”, no entanto. Portanto, deixemos ficar por aí.

Como foi o processo de gravação e com que “ferramentas” trabalharam para erigir o som da banda?
Gravámos as pistas de base ao vivo em estúdio, uma grande e antiga sala no antigo edifício da rádio de Copenhaga. Não tínhamos, realmente, permissão para lá estar, mas fizemos um acordo com um estudante de engenharia de som. Ele fez tudo parecer como se fosse parte dos seus estudos gravar uma banda como nós num local construído para gravar música clássica.
Também fizemos lá alguns overdubs, mas o mais interessante foi o dia em que foi gravada a parte de violoncelo para “Expanding Horizons (Dar Es Salaam)”. A namorada do meu irmão mais velho, a Julie, uma mulher jovem, magra e graciosa, entrou ligeira no estúdio enquanto carregava a case de um violoncelo que tinha o dobro do seu tamanho. Toda a gente envolvida no processo de gravação fez fila para a ajudar. Foi mesmerizante vê-la fazer a sua magia através das grandes janelas da regie do estúdio. Saiu tão prontamente como chegara e as pessoas tiveram que se forçar a fechar os seus maxilares. Mais tarde no processo, introduzimos outra violoncelista, a Cæcilie, que já havia tocado connosco em várias ocasiões. O espanto atacou-nos de novo. Ela é para manter.

Como surgiu o acordo com a Matador Records? O EP “Walk On Heads” foi determinante?
Conhecemos os “Mr. Matador” (Chris Lombardi) em Oslo, na Noruega, de todos os lugares possíveis. Uma bebida levou a outra. De repente, estávamos a assinar.

Para terminar, vocês são bad eggs (má rês) ou apenas pessoas normais que fazem música bem badass?
Vi kan ikke lægge æg

Foto: Linn Heidi Stokkedal