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Dean Blunt

Dean Blunt

2013-11-05, Teatro Maria Matos
Timóteo Azevedo
9

O concerto, focado nos álbuns “The Redeemer” e “Stone Island”, é uma expressão a viver por ela própria como uma performance autónoma. Dean Blunt ao vivo é uma experiência que vai muito para além da música. Há todo um mise-en-scène programado com um objectivo cristalino, mas com uma aura indizível. Com a sala previamente empestada de “nevoeiro”, e completamente às escura, ouve-se chuva e um piano disperso, numa introdução que demora cerca de 10 minutos. Tempo suficiente para habituar os olhos e o espírito ao escuro.

Acende-se um foco sobre Dean Blunt e vemo-lo na sua figura de lobo suburbano, envolto em fumo, e numa atitude de completo desprendimento com o público. Ouve-se a sua voz pela primeira vez com a “The Pedigree”, e vai se afirmando sempre essa encenação já referida, desde os seus passos em circulo, a sua expressão corporal, as suas sucessivas ameaças inconcretizadas de proferir algo ao microfone. O cenário, para além do piano de meia-cauda, incluí um homem de fato sempre na mesma posição atrás de Dean Blunt, como um guarda-costas ou anjo redentor pós-moderno.

“The Redeemer”, lançado este ano por Dean Blunt, é um álbum que vibra entre a simplicidade e a intensidade. Para além dos arranjos estruturais ancorados na electrónica e no sampling, é atravessado por um ocasional trompete triste – que ao vivo foi tocado por David Gray – que lhe confere o ambiente que é o aparentemente procurado: fala essencialmente sobre a ausência e a disrupção emocional provocada pelo fim de uma relação.

Essa disrupção é algo que parece estar assente no sistema geral do espectáculo, mas são sempre daquelas coisas que não podemos ter certezas, apenas pequenos rasgos de lucidez sensível. Em parte, o chocante e visceral deste concerto é a coragem de encarar/encenar o microfone como um depositário, num acto de despojamento em frente ao público; como se, afinal, o que estivéssemos a assistir não fosse um concerto mas uma peça encenada sobre um evento imaginado, sofrido. Aquele reviver terapêutico, logo, necessariamente descolado do real, que cada um de nós já passou com a perda de alguém. Como se, para aguentar fazer aquilo, Dean Blunt tivesse que obritagoriamente colocar tudo no campo da representação.

Para algo que já tínhamos sido precavidos com um aviso no exterior da sala, a dada altura entram espasmos de luzes, vulgo strobes, sincronizados com um som que fazia vibrar a sala com as frequências mais baixas. Uma onda sinusoidal com crescendos alucinogénicos, que, com a agressividade luminar dos strobes, criou uma experiência arrebatadora.

O fim do ano aproxima-se e permito-me afirmar que este foi um dos concertos, no sentido etimológico da palavra, mais extraordinários de 2013.

O set foi buscar do álbum “The Redeemer”, com músicas como a “Demon”, “The Redeemer”, “Need 2 Let You Go” e ainda com a “Imperial Gold”, que foi a música que fechou o concerto, a cargo de Joanne Robertson, que toca guitarra e empresta a sua doce voz em algumas músicas, mas também ao álbum “Stone Island”, lançado em Agosto deste ano, com músicas como a “Three”, “Six”, “Eight” e “One”.

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Fotografias cedidas e com autoria de Luís Martins.